segunda-feira, 28 de junho de 2010

tempo tempo tempo mano velho

Preciso não dormir até se consumar o tempo da gente.
Preciso conduzir um tempo de te amar.
Te amando devagar e urgentemente.
Pretendo descobrir no último momento um tempo que refaz o que desfez,
que recolhe todo sentimento.
E bota no corpo uma outra vez.
Prometo te querer até o amor cair doente, doente.
Prefiro então partir.

A tempo de poder a gente se desvencilhar da gente.

Depois de te perder te encontro,com certeza.
Talvez num tempo da delicadeza,
onde não diremos nada,
nada aconteceu.
Apenas seguirei como encantado ao lado teu.


Eu gosto tanto do Chico Buarque, mas essa eu não conhecia. Me apareceu na telona do curso no Pontão justo hoje, meio que zombando de mim, acho. E ver a Carolina Assad cantando de olhos fechados na telona como que fez nascer uma flor aqui dentro, a turma ficou meio suspensa no ar por um momento. E eu me rendi, como não podia deixar de ser.
(I let you stay with me if you surrender)

quinta-feira, 24 de junho de 2010

partida

Eu tava sonolenta no banco de madeira da pequena estação de trem de Toledo. Tinha andado o dia todo pela cidade inteira embaixo de sol, ignorando uma gripe espanhola que me pegou de jeito por lá mas não podia atrapalhar. Eu e meus primos esperávamos o penúltimo trem do dia de Toledo pra Madri. Ainda fazia sol lá fora, aliás naquele lugar de além-mar, o sol se põe lá pelas oito e meia da noite, os dias parecem eternos (aah, el verano!).
Vários turistas já começavam a chegar, nossos companheiros de trem. Ouvimos português no salão perto da gente: cariocas, um casal jovem e o filho de uns 3 anos. Depois de um tempinho mais português, esse mais chiado do que o carioquês: família portuguesa.
Os dois menininhos portugueses, de uns 5 e 8 anos, tinham uma bola e começaram a brincadeira. O brasileiro logo desceu do carrinho e nem tirou a chupeta, não falou nada, o que me fez pensar se o futebol não é mesmo uma língua internacional.
De repente o salão de ornamentos toledanos já tinha virado quadra e todo mundo em volta era torcida. E a mãe portuguesa, com os olhos cheios de carinho, olhou pra brasileira e disse com ar de orgulho:
- A melhor seleção da Europa. Contra a melhor seleção do mundo.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

aqui aquém-mar

Acordei ás 7 só pra dar uma força. Solidariedade com Portugal, uma terra que eu não gosto desde sempre, mas que eu gosto desde que vi.
Concentrei todas as minhas forças na torcida, eu sei que estar lá na Europa ás vezes não é mole pra eles, aquele povo que olha inocente e fala chiado merece sorriso de golo.
Comecei deitada no sofá
1, bonito golo!
2 que lindos.
3 socorro.
4 levantei.
5 ai minha barriga, eu tô gritando.
6 no lo creoooo, que liiiindos.
E aí eu já tava mais do que me sentindo culpada, torcendo tão forte sem querer pra uma seleção que nem era a minha. A minha é melhor, a minha é Brasil, Liedson. Mas aí veio o 7 inevitável, que esse ninguém segurava, que 7 é meu número da sorte.
Da sorte no jogo, amor.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

espelho


Drica era miúda também, gostava de fivelas também, como qualquer outra. Podia ser bonita sim, se se mudassem os padrões de beleza do mundo. Drica era uma pintura e estava na sala errada. Não era uma bailarina de Degas cheia de graça. Não era uma escultura grega que se a gente girasse num eixo permaneceria na mesma posição, por séculos. Drica não era um corpo do Livro.
Era uma mulher de Picasso, bunda de um lado, peito de outro, cabeça fora. Drica jamais conseguiria ser um bloco de concreto. Concreto era bem longe dela. Drica jamais seria reta, jamais contínua. Drica era uma mulher de Picasso, entendam, de Picasso.
(Sim, cubista. E nada concreto. Martelo com malemolência, você sabe, sempre soube.
E me perdoe se o quadradismo dos meus versos vai de encontro aos intelectos. Mas você abusou.)